Eu tive um tio chamado Antônio de quem eu guardo as melhores lembranças e as maiores saudades. Ele morreu cedo, porque ‘os bons morrem jovens’, já disse o Renato Russo – que também se foi cedo, vítima da mesma doença. Mas no tempo em que esteve entre nós meu tio Antônio foi o tio, para várias gerações da nossa família, de presença marcante para primos e irmãos mais velhos e mais novos, e ainda para os filhos deles. Ele foi, e ainda será por muito tempo, o fio condutor e o elo de ligação na ”Via-láctea da nossa família”, como ele me escreveu num cartão de agradecimento, transcrito abaixo.
Uma das lembranças mais doces e antigas que eu guardo do meu tio Antônio é de quando eu e meu irmão chegávamos na casa da minha vó, íamos correndo pro quarto dele e pedíamos para ele colocar pela milésima vez o disco do Pluft, o fantasminha, da Maria Clara Machado. Já era um disco diferente de todos porque era azul. Depois, tinha um elenco fantástico, encabeçado pela Louise Cardoso, que nos contava uma história genial sobre um fantasma que tinha medo de gente. Naquela época sem fita cassete nem dvd, aquela era a nossa história de estimação, que a gente conhecia de cor mas queria sempre tornar a ouvir. E hoje, quase trinta anos depois, eu sou capaz de lembrar de diálogos inteiros, das canções, do primo Xisto e da prima Bolha como se tivesse ouvido o disco ontem.
Eu gostaria muito de colocar esse disco pra minha filha escutar – porque é maravilhoso e por causa do valor sentimental que tem para mim. Já tentei consegui-lo via internet, em saldos; já encomendei ao meu irmão, que é perito em achar discos raros e também teria todo interesse em resgatar esse pedaço de infância da nossa vida, mas nada. Agora uso o blogue pra fazer esse apelo, meio que parafraseando o Exupéry que pede para avisá-lo se alguém souber do Pequeno Príncipe. Quem tiver esse lp e quiser vender, grava-lo, reeditá-lo, ‘escreva-me depressa dizendo que ele voltou’. Será uma maneira simbólica de unir meu tio e minha filha, formando mais uma constelação da nossa família.
Essas palavras são de gratidão
e carinho
nada como ter o sol, o mar
florestas e sobrinhos.
Sobrinha minha, ponto + ponto
formando uma só linha
Que joga meu coração como pipa
ao mais alto céu que a vista ‘via’
A via láctea da nossa família.
Antônio Luiz da Costa, dezembro de 1982
Helena Costa
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Nossa, li esse texto só agora, mais de 10 anos depois de postado, graças à newsletter (viu, ela é importante!). Meu pai não é de falar muito sobre família, mas já comentou comigo o quanto o Tio Antônio era legal – segundo meu pai, foi ele que o fez conhecer Led Zeppelin, Pink Floyd e rock progressivo. Minha mãe também sempre falou com muito muito carinho dele. Disse que era um ser humano incrível, que certamente eu adoraria conhecê-lo – e que nos daríamos muito bem. Eu era bem nova quando ela me contava as histórias dele, então eu idealizei muito o Tio Antônio e cresci com essa saudade de quem eu nem conheci. Fazia muito tempo que eu não pensava nisso e agora me voltou esse sentimento (também caiu um cisco no meu olho pq né, sou canceriana). Obrigada por me acender isso novamente. Um beijo :)
Ah, prima, que delícia ler isso! Bom saber que a newsletter está sendo útil, de maneiras que eu nem mesmo esperava. E é gratificante contribuir para manter a memória do tio Antônio de algum modo. Não daquele jeito careta reverente e vazio de que se diz “manter a memória” de alguém, mas de um jeito pulsante e emocionado que tem a ver com ele e com a nossa família (mesmo a parte carrancuda e pouco eloquente da família rsrsrs…). Entendo perfeitamente sua mãe: para nós que convivemos com ele fica, além da saudade, a certeza de que você e a minha Júlia, por exemplo, se dariam muito bem com ele…
Beijo grade pra você!
Helê
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