Da série “Corações”
Helê
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“De tudo o que somos ou fomos para os outros, às vezes só resta aquilo que não somos nem nunca fomos para nós. Não faz mal, pensei. Acho que é isso que vai tornando o Amor possível, podermos escolher aquilo de que nós lembramos nos outros.”
Estas linhas e as ideias que carregam me impressionaram bastante. Horas depois de lê-las, ao saber que Carlos Hasenbalg havia morrido, me pus a pensar sobre o que ficou dele. Para muitos ele deixa uma obra indispensável para entender o Brasil (que não se dá a conhecer sem que se trate de relações raciais). Para mim restaram algumas lembranças: a voz grave, os olhos de um azul profundo, o sotaque quase irresistível, sorrisos e resmungos, bom humor e rabugice combinados, algumas divertidas mesas de bar. Também me lembro dele na festa de trinta anos de uma amiga, tranquilizando a todas nós, pré-balzquianas ansiosas, garantindo que nessa idade começaríamos a ficar realmente interessantes. Carlos sabia ser galante sem ser cafajeste, habilidade praticamente extinta nos dias de hoje.
Nunca cheguei a ser íntima, nem mesmo próxima; não cheguei a chamá-lo de Carlito, como os amigos. O que torna mais significativo outro episódio guardado no baú das recordações: ele aceitou sem titubear ser fiador do primeiro apartamento que aluguei, assim que passei para o mestrado (curso que ele me incentivou a fazer). Entre sério e brincalhão, mencionou que perdera a conta de quantas vezes havia sido fiador de outras mulheres negras nesta cidade. Era assim o Carlos: alguém que percebia a dimensão política de atos prosaicos, um intelectual coerente na vida pessoal (outra raridade, desde sempre).
Não o via há muitos anos e saber que ele está definitivamente inacessível causa um pesar acanhado, que temo não ter o direito de sentir. Ele morreu em Buenos Aires, só soube alguns dias depois, na ágora virtual do Facebook. Fazem falta os rituais fúnebres, sobretudo porque a dor, de qualquer tamanho ou natureza, torna-se mais suportável na companhia de outros. As liturgias servem para que a gente organize os sentimentos, se despeça, conte histórias como essas que relembrei aqui, homenageando a pessoa com lágrimas, suspiros e até sorrisos. Permitem que depois a gente siga, tentando esquecer que outras perdas virão e prometendo aproveitar melhor oportunidades, pessoas, a vida, enfim Na falta de outro lugar, acomodo aqui meu pesar, entre carinho e saudade transformados em palavras .
Helê
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(Emeric Chantier – Empty Kingdom – Art Blog via Karen Paul )
Da série “Corações”
Helê
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Durante 14 dias fui feliz. O mês era maio, e a cidade, Paris. Encontrei felicidade antes, mas nunca rimou nem durou tanto. Nova York foi uma onda diferente, feito a do Herbert, mas também não senti solidão, mesmo sozinha. De modo que: ou descubro o que me alimenta e sustenta quando viajo ou viro aeromoça – embora suspeite que esteja um pouco tarde pra isso. Em trânsito a solidão não me alcança; se ela se aproxima não percebo, estou muito ocupada para isso. Na vida real, oito horas diárias de trabalho (mal) remunerado e mais outras tantas de manutenção da existência – contas/médicos/chatices/etc – e incrivelmente sobra tempo e espaço para se sentir só. Viajar é bem mais preciso: ajusta nossas bússolas, sintoniza frequências seminais, afina os instrumentos internos. Ou distrai, apenas – é pouco? Tenho sonhado com Portugal e ele me vem em vários sinais, como o livro da Calcanhotto, saga lusa que me arrebatou. Também Minas tem cismado em atravessar meu caminho, seja em canções ou lembranças, todas inesperadas. Garrei paixão desde a primeira vez que vi aquele mar de montanhas, mesmo sendo menina de beira-mar (modo de dizer, que eu sou do subúrbio, mas ser carioca é se apossar). Minas, o céu mais lindo, a travessia, sempre. Se for ver bem, Minas e Portugal na minha rota faz todo sentido, há mais semelhança entre as montanhas de Ouro Preto e as ladeiras de Lisboa do que um Atlântico pode explicar. Minha mineira amiga Vera, Veríssima – uma pessoa mesmo superlativa, e também a única que merece usar o feminino de meu Rei – tem toda razão, dias ruins rendem bons textos. Podemos então hoje nos contentar com um texto meia boca e esperar por um dia assim, mais pro contente? Quero poder escrever desse jeito fluido, esquivando da razão e dando rasteira na ordem, sem embaçar a vista e sem digitar com o coração na mão toda vez. Se não for possível alegria com poesia tô lascada, não abro mão de nenhuma. Tem também que tristeza cansa, viu? E dá numa rua sem saída, coisa mais sem graça. O ipê não floriu, mas na semana passada teve dois dias lindos, daqueles que dá vergonha sofrer, não fica nem bem. Além do mais eu fiz aniversário , mesmo sem querer, e eu não resisto ao meu aniversário, como observou D., com propriedade. Li e respondi cada um dos meus parabéns, como se cada um deles fosse uma vela, um pedido, uma oração. Sejam fieis.
Helê
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• No ibope dos carros, dá Aécio disparado. Parece que dilmistas e marinistas andam mesmo é de ônibus.
• É legal ter uma disputa com três mulheres de estilos tão diferentes. As candidatas vão deixando de ser um bicho exótico e se incorporam à paisagem, como uma parte natural do jogo político. Faltam mais negros, mais gays, mais gente diferente para que a eleição verdadeiramente retrate a cara do Brasil.
• Aqui no Rio o pleito tem um quê de Patópolis. Pezão contra Garotinho pra mim é coisa de gibi.
-Monix-
* Drops, só os da Drops da Fal
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Da série “Corações”
Helê
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