Bora passar raiva juntas?

No Brasil:

Uma menina ou mulher é estuprada a cada 10 minutos. Fonte

Três mulheres são vítimas de feminicídio a cada um dia. Fonte

Uma travesti ou mulher trans é assassinada no país a cada 2 dias. Fonte

26 mulheres sofrem agressão física por hora. Fonte

Imagem copiada do site do Fundo Elas

Tudo que nós têm é nós – parabéns por sobreviver.

Helê

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Alegria é a prova dos nove

Matheus Nachtergaele, numa entrevista inteligente e original (coisa raríssima na cobertura televisiva do carnaval), me lembrou dessa frase espetacular do Oswald de Andrade – que eu aprendi, ainda pequena, com Gilberto Gil em “Geleia Geral“. Eu devia ter uns 10, 11 anos, e ficava um pouco intrigada pensando: a prova dos nove de quê exatamente, qual era a conta? Mas intuía que aquilo estava certo e era bom (e sempre me incomodei com o verso seguinte, tristeza não pode ser porto seguro para ninguém).

Hoje sei que alegria é a prova dos nove da vida, é o que certifica que continuamos pulsando e que vale a pena, malgrado as subtrações injustas que sofremos ao longa da caminhada. Nós, por exemplo, perdemos décadas durante os últimos quatro anos de governo. Mas então fomos pra rua pra constatar que sobrevivemos – e aqui estamos, no lo fuimos, no lo vamos. Continuamos capazes de sorrir e gozar coletivamente, a maior afronta possível para a necropolítica e seus adeptos.

Foi durante este carnaval que eu me dei conta do que foi viver quatro anos sob um governo fascista, sendo dois deles sem carnaval. Percebi com todos os sentidos, como quem olha para o carro capotado depois de sair das ferragens: foi brutal. A gente nem entende exatamente como conseguiu; talvez uma certeza inconsciente, atávica e inabalável que a alegria não sucumbiria. “Resistir é lei, arte é rebeldia”, Mangueira, 2023.

E eu podia deixar passar esse São Jorge? Paulo Barros, para Vila Isabel

Nesse indispensável lapso de lucidez que é o carnaval, celebramos nossas vitórias – sim, a gente cantou “olé, olé, olé, olá Lulá, Lulá” em vários momentos, o que é muito significativo uma vez que já ganhamos, somos governo (se reclamar cantaremos mais!). Acho que é também uma maneira de reafirmar nossa escolha e a vigília eterna pela liberdade. Mesmo sabendo que “eles são muitos, mas não podem voar”.

Este ano ficou fácil para aqueles que apresentam defeito de fábrica e dizem não entender o porquê da euforia do carnaval. Havia muito a comemorar, extravasar e cair de boca, em face do tudo o que vivemos. Mas a minha tese é que a alegria é a prova dos nove da vida, seja ela difícil ou não. Eu até consigo compreender as pessoas que têm dificuldade em entender que alegria é essa que a gente sente no carnaval, porque deve ser a mesma dificuldade que eu tenho de entender essa pergunta.

Experimentamos pequenos e grandes prazeres. A ministra Margareth desfilando na Mangueira, onde o Rio é mais baiano. A entrevista do Nachtergaele, citado no início do post: encarnando Lampião, ele sublinhou a importância de homenagear o Nordeste, que nos salvou do fascismo – com essas palavras, ao vivo na Globo (foi lindo). Ele ainda nem sabia, àquela altura, que essa homenagem ia ganhar o campeonato e dar mais um título ao meu carnavalesco do coração, Leandro Vieira. Que deu ontem uma entrevista deliciosa, ao vivo, reafirmando o poder da comunidade, revelando que teve dor de barriga o dia todo e que iria beber tanto quanto trabalhou! Divertido, anárquico, fora do padrão, alegre, carioca, carnavalesco. Que prazer de ver campeã a escola de Ramos, composta em grande parte por moradores do CPX, o mesmo Complexo do Alemão visitado por Lula e cuja sigla tentaram criminalizar – como de resto, tudo o que se refere às favelas.

Estão chamando de pé quente….

E assim, muito a contragosto e na marra, encerro as reflexões sobre o carnaval 2023. Olho desolada para a bagunça da minha casa, mas aí lembro da lição aprendida esse ano no Boitatá, com o bamba Moysés Marques: “Carnaval, manga e sexo, se terminar limpo, é porque você não fez direito”.

Helê

A volta

Escutei os teus sinais numa segunda-feira no Saara, procurando fantasias e adereços com minha filha e com a Dedeia. Experimenta daqui, pechincha dali, “lembra daquele ano em que a gente comprou duas caipirinhas giga por 10 reais?” “Será que eu tenho coragem de usar esse short?” “Ah, 15 nesse brinco eu não pago, 12 no máximo”. Tudo isso entrando e saindo de loja, mandando foto de acessório pra quem não veio e com um sol pra cada uma. Mas ali a gente já começou a se divertir e ter certeza de que ele, enfim, voltaria.

Achei que o reencontro seria no Cordão do Boitatá no domingo, às 7h. Mas aconteceu um pouco antes, quando me vi dividindo um uber com o Fábio, a Bia e o Henrique – que nunca tinha visto na vida e que, como eu, encontraram o metrô fechado. A cidade, que tem diferentes estágios de emergência – vigilância, atenção, alerta – já estava em estágio de Carnaval: o único em que você não hesita em dividir um carro com três desconhecidos, todos comprometidos em exercer a faceta mais malemolente da nossa cidadania: brincar carnaval. Recebi pix de uma margarida, um cara com antenas (?) e outro vagamente das Arábias e chegamos a tempo para o nosso compromisso, há dois anos adiado e esperado.

Na arrumação do Cordão, a banda esquentou homenageando o aniversariante do dia, Martinho da Vila, conclamando: “Vamos renascer das cinzas” – e eu já arrepiei. Na saída do bloco, aos primeiros acordes de “Tristeza/por favor, vá embora”, eu segurei o choro pra não estragar a maquiagem nem borrar a purpurina: ali eu tive certeza que o Carnaval voltou.

Aí foi partir pro abraço, ficar na muvuca, sair da muvuca, encontrar conhecido, beber líquidos de origem duvidosa, sorrir e receber sorrisos, muita gentileza e simpatia de quem, como eu, estava morrendo de saudade. O Cordão do Boitatá tem uma aura meio mágica, uma mistura de novidade e tradição bem peculiar, capaz de tocar o “Trenzinho Caipira” , “Carinhoso” e “Baianidade Nagô” com mesma excelência e animação; que tem uma ala de baianas e também de pernas de pau, tudo junto e misturado e lindo. Desfilei com a Manu, a eterna musa do GRBC Me chama que eu vou, pessoa que sente o carnaval da mesma forma que eu (sintonia rara e sacra). Depois encontramos com Dedeia, que cumpriu belamente a missão de segurar a cobra durante o desfile (êpa!), e seguimos pelo Centro encontrando amigos, ocupando a rua, felizes e emocionadas com esse esperado reencontro.

Já é!

Bom carnaval a todes; evoé, Momo!

Cordão do Boitatá — Foto: Foto Luciola Vilela /Riotur

Amizade que transcende

Os fridinhos no Rock in Rio

Hoje é dia de celebrar a Helê, e eu aproveito para celebrar nossa amizade.

Faz quase vinte anos que essa moça da risada fácil e das palavras bonitas entrou na minha vida pra ficar, e a gente não se largou nunca mais. Mudamos de empregos, moramos em outras casas, viajamos pelo mundo, tanta coisa se modificou ao longo desse tempo.

A gente tinha dois bebês que mal andavam e falavam, hoje entregamos pro mundo esses xóvens lindos que estão aí na foto. Que têm uma amizade própria, que anda sozinha e não depende da gente. Nesse seu aniversário, sócia, o presente que nós duas ganhamos é ver esses dois trilhando um caminho que a gente até ajudou a construir, mas que agora depende basicamente deles mesmos. A gente pode ser mothern, mas somos também mães do “casaquinho” e mães do “quem meu filho beija minha boca adoça”. Por isso escolhi pra este aniversário uma foto da sua Djubs, que eu vi crescer e que tem tanto de você nela.

Hoje é aniversário da Helê, a moça da risada fácil e das palavras bonitas, que veio ao mundo no dia dos Erês para espalhar alegria que bem querer por esse mundo afora. Salve ela!

-Monix-

Independência e vida

Desculpe aí, patriarcado, mas são duzentos anos de uma história contada pela metade, então hoje precisamos fazer uma correção importante. A independência do Brasil foi proclamada por uma mulher. É isso mesmo, repito para que não haja dúvidas:

A independência do Brasil foi proclamada por uma mulher. No dia 2 de setembro de 1822.

Essa mulher se chamava Maria Leopoldina, e hoje seu nome é mais reconhecido quando vem com um sufixo, no nome da escola de samba Imperatriz Leopoldinense. Duzentos anos atrás, ela era a princesa regente do Brasil, portanto quem tinha autoridade para tomar decisões e assinar documentos oficiais. E foi isso que ela fez naquele 2 de setembro. Portugal queria que D. Pedro voltasse à Europa. A corte brasileira pressionava pela independência do Brasil. A relação colonial já não fazia sentido. Mas o príncipe estava ausente (ué, um homem ausente na hora que mais se precisa dele, cê jura?). Quem botou o dito cujo na mesa foi a consorte de apenas 25 anos, que tinha sido preparada a vida inteira para cumprir com os deveres de Estado.

Nos dois episódios históricos de 1822, Leopoldina esteve em defesa da emancipação brasileira. Em 13 de agosto (…) D. Pedro viajou para São Paulo , e Leopoldina assumiu pela primeira vez a regência do país. Durante esse período, no dia 2 de setembro, presidiu a sessão do Conselho de Estado na qual deliberou a separação entre os dois reinos, fazendo registrar na ata a assinatura de todos os ministros. Documentos afirmam que a independência foi oficialmente decidida nessa ocasião, e alguns dias depois proclamada por D. Pedro às margens do Ipiranga.

(Trecho extraído do verbete sobre Leopoldina de Habsburgo-Lorena, do Dicionário Mulheres do Brasil)

Leopoldina comeu o pão que o diabo amassou no Brasil, mas amou este país até o final

A história oficial tende a apagar a participação feminina nos grandes eventos ao longo dos séculos, mas nunca é tarde para revisitar o cânone e dar crédito a quem merece. Além de Leopoldina, que atuou aqui na corte do Rio de Janeiro, o Brasil como o conhecemos hoje deve muito às heroínas da independência da Bahia: Maria Quitéria, Joana Angélica e Maria Felipa. Essa história também merece ser contada, mas hoje, 2 de setembro, o que eu quero é propor que comemoremos a verdadeira data de independência do Brasil relembrando Leopoldina — por exemplo, você já leu o livro da Fal e da Suzi? E se não leu, o que está esperando?

Olha quem já leu… Só falta você rsrsrs (a foto é montagem, mas fica a dica como inspiração)

A independência contada da perspectiva masculina tem cavalos, uma espada meio fálica (ops) e um grito que fala em morte. O que eu quero é uma independência que fale de vida, e a Imperatriz Leopoldina, com toda sua dignidade perante o sofrimento, sua habilidade para construir alianças e sua vocação para os negócios de Estado me parece uma representante muito melhor do espírito que devemos buscar para a nação brasileira.

-Monix-

23 de agosto

Omar ibn Said

Se há leis que pegam e outras não, também há datas que não conseguem se fixar no calendário de eventos. Eu descobri ainda há pouco que hoje é o Dia Internacional da Recordação do Tráfico Negreiro e da sua Abolição, de acordo com a UNESCO, que celebra a data desde 1998. Em 23 de agosto de 1791 aconteceu no Haiti a primeira rebelião de independência nas Américas liderada pelos africanos escravizados. Como eu aprendi com o Projeto Querino (escuta absolutamente indispensável), essa revolução passou a ser o terror das elites dominantes, que temiam que os negros escravizados de outras colônias fizessem o mesmo. Séculos se passaram e ainda há o que temer, visto que no país que recebeu cerca de um terço de todas as pessoas traficadas no período das colônias, na cidade que recebeu um milhão dessas pessoas, ninguém fala sobre o Dia Internacional da Recordação do Tráfico Negreiro e da sua Abolição. Talvez porque a data fale explicitamente sobre recordar, e todo o esforço nacional foi o de esquecer, abafar e sepultar a escravidão e suas sequelas. Em vão: estamos aqui para recordar, repetir e elaborar*.

PS: Soube da data por um fio no tuíter (em inglês) falando sobre Omar ibn Said, um estudioso muçulmano que foi escravizado nos Estados Unidos e escreveu em árabe sua autobiografia.

*Eu não li o texto do Freud, mas só o título eu já acho poderosíssimo e certeiro.

Helê

São Jorge, carnaval

Eu já reclamei no twitter (onde mais, né?) desse calendário doido em que o carnaval vem depois da Páscoa – e nem católica eu sou, veja você!… Botei a culpa do meu desconforto no ascendente em virgem, mas esse moço definiu melhor:

Tentando abotoar essa camisa existencial e retomar os preceitos fundamentais da vida, lá fui eu no dia 23 para a Igreja de São Jorge, vestida de melindrosa. Porque também era sábado de carnaval, a roupa é vermelha, achei que o Santo entenderia. Em sinal de respeito, tirei a pena da cabeça, na hora da reza.

Foi um reencontro comovido, como têm sido todos na Retomada. Eu, que já choro nessas ocasiões porque a fé me emociona demais, chorei dobrado esses dois anos de ausência, perdas e lutas, em que, apesar de tudo, as roupas e as armas de Jorge protegeram não só a mim, mas também os meus. Salve, Jorge! Sempre! Ogunhê!

São Jorge Ogun no desfile da campeã Império Serrano

Como faço todos os anos, saí da igreja com planos vagos, disposta a andar um pouco pelas redondezas, observando o movimento dos fiéis, disponível para o que a rua oferecesse. Sempre, desde que instaurei pra mim essa tradição de ir à Igreja no dia de Jorge, coisas surprendentes e felizes acontecem: já encontrei rodas de samba memoráveis, já comi feijoada de graça, encontrei amigos, vi apresentações de choro, celebração de umbanda no Campo de Santana, já fui parar na quadra da Estácio de Sá… Desta vez achei que nada aconteceria já que o movimento foi muito menor, mas ao longe ouvi um batuque, fui me aproximando e era um maracatu que veio ao meu encontro. Vinha lindo e potente o Baque Mulher, com sua magnética rainha à frente, e eu fui acompanhando o cortejo, lembrando imediatamente dos passos, como se não fizesse dois anos que eu não dançava. E para que o recado não passasse despercebido, minha mestra no Tambores de Olokun me encontrou no meio do povo, e num abraço esfuziante me convocou: “Volta!”.

Surpreendentes e felizes, eu disse.

Depois disso, fui até a Praça da Harmonia, onde novamente encontrei São Jorge e uma mistura indelével de fiéis e foliões. No caminho, fui abordada por um “frei” (“ô, melindrosa, sabe que horas sai o bloco?”), fiz duas amigas (“Oi, eu sou a Vanessa, ela é a Michele, tá indo pra praça também?”) e ouvi alguém reclamando sozinho pela rua: “É São Jorge, é carnaval, é jogo do Flamengo, assim não dá! Vai ter que ter um auxílio emergencial de mil reais! E quando o Lula for eleito, vai ter outro carnaval!”. Ou seja, puro suco de Rio de Janeiro, só um pouco mais bagunçado que o habitual.

Fora essa rápida saída sacro-profana, o carnaval de abril não me capturou, e nem sei explicar bem o porquê. Só não bateu, simples assim. Acabei curtindo pela tevê, e mesmo assim, só algumas escolas. A Mangueira, belíssima, me fez chorar em camadas com a comissão de frente: o surgimento dos três homenageados, as rosas brotando, a homenagem a Seu Nelson Sargento. É realmente uma lástima que não tenhamos nova oportunidade de vê-la, assim como o magnífico carro em que Seu Delegado bailava etéreo sobre uma caixa de música, bailarino exímio que foi (tive a honra de vê-lo de perto e cumprimentar, juntamente com D. Mocinha, em uma apresentação na Uerj, garbo e elegância inesquecíveis). Não consegui uma boa foto desse carro, o que me fez pensar que o desfile tem uma volatilidade desconcertante. Todos os anos vemos alas refinadas, fantasias primorosas, carros estonteantes por alguns minutos – e isso dentre aquilo que a transmissão monopolizada, precária e parcial decide mostrar, que ainda é apenas uma parte o espetáculo real. A gente não pode normalizar algo tão improvável e espetacular, e deveríamos manter um registro cuidadoso dessa expressão ímpar e magnífica que é o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. Que mesmo acontecendo meio fora de lugar no calendário, foi fundamental para restabelecer laços, crenças e esperanças. Além de marcar o tempo: é preciso o carnaval, ou pelo menos o desfile, sua raiz profunda, para que a gente acerte os botões da camisa – ou desista dela de uma vez e vista um collant de lamê.

Quem sabe agora, com Exu devidamente reconhecido e celebrado – ele que deve ser o primeiro a ser servido – não possamos nós, de fato, recomeçar? Laroyê! E que a gente cumpra a obrigação ancestral de ser feliz.
Helê

Monix Day!

Mesmo de volta à vida normal, depois de um carnaval extemporâneo, ainda há motivos para felicidade: hoje é dia dela, a minha sócia, a nossa Monix, Hermione carioca, a melhor anfitriã dessa cidade, e mil outras qualidades que vocês podem lembrar ali embaixo, nos comentários. Vamos para mais uma dose de alegria para celebrar o presente que é tê-la nas nossas vidas, virtual ou digitalmente. Venha festejar e deixe pegadas!

Helê

O não-carnaval

Se a guerra for declarada
Em pleno domingo de carnaval
Verás que um filho não foge à luta
Brasil, recruta
O teu pessoal

Se a terra anda ameaçada
De se acabar numa explosão de sal
Se aliste, meu camarada
A gente vai salvar o nosso carnaval

Alguém sugeriu que, já que vai ter guerra mesmo, deviam então liberar o carnaval (foi no tuíter, claro, aquele repositório de sabedoria e bobagens). Desde então eu não tiro da cabeça essa marchinha deliciosa do Chico, na qual a tropa do general da banda dança o samba em Berlim, a melindrosa manda bala e a rajada é de tamborim.

Caminhando para o terceiro ano de pandemia temos novamente o carnaval cancelado – mas se pagar, pode. Suspensos o desfile das escolas e o esparramar dos blocos, multiplicam-se programações pagas pela cidade, porque o coranavírus, como se sabe, só funciona em eventos gratuitos. Surgem também, aqui e ali, uns subversivos que insistem em ir às ruas, e assim o carnaval popular carioca entra na clandestinidade – algo que eu nunca pensei que veria.

Mas o Francis Hime, parceiro de Chico, perguntou há tempo atrás, numa canção repleta de absurdos, “e se o carnaval cair em abril?” , e é para este mês que foi transferido o desfile na Sapucaí. E não podemos esquecer que o Botafogo foi campeão (da segunda divisão, mas o Francis não especificou). Então eu já não duvido de mais nada, e torço pro meu amor gostar, então, de mim.

Não consigo evitar a melancolia desses dias, um banzo orgânico e incontornável. Não julgo quem vai pra folia, pagando ou escondido; condeno o poder público, incapaz de exercer a autoridade concedida pela população para protegê-la. Para mim não funciona esse carnaval meia boca, fantasia é muito diferente de disfarce. Eu quero ver cada paralelepípedo dessa cidade se arrepiar, quero botar o bloco na rua, festejar o teu sofrer, o teu penar, ser rainha no meio de uma gente tão modesta. Na rua e sem medo.

Pretendo encontrar uns poucos amigos, tomar algumas cervejas e dar um grito de Carnaval (só um, pra não espantar a clientela do bar). Vou aproveitar para discuitr com outro foliões desterrados nomes de não-blocos, como Náufragos da Alegria, Se melhorar eu volto, Abstêmios da Folia, Órfãos de Momo, Me beija que eu tô vacinada, Sambistas da Saudade. Uma brincadeira melancólica, mas é o que temos para hoje.

Sigo torcendo para que em 2023 a gente volte pra rua com alegria e fervor. Até lá, vou continuar me guardando pra quando o carnaval chegar.

Helê

Yemanjá, a rainha do mar

Do Pinterest

Odo Yá!

Helê

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