Bye, B.B.

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Uma morte a lamentar, como se deve fazer com os bons, sobretudo com os melhores. Mas a partida de Mister B.B. King me dá vontade de celebrar sua vida ouvindo muito blues e tomando o melhor uísque que encontrar. Com a morte dele consigo ser budista, reagir serena  e conformada. Porque, afinal,  o cara meteu o pé com 89 anos anos, fez show até anteontem; passou a perna na morte por um bom tempo – ela que já lhe fungava o cangote com descortesias como um diabetes. Quer dizer, o cara viveu, em bold e com todas as vogais da palavra – e mais uns riffs  entre uma letra e outra. Atravessou décadas, gêneros, artistas, modismos e permaneceu. Eu adoro “Riding with the king”, título, capa  e conceito.  Uma sacada genial e invejável do Clapton – quem entre nós não gostaria de fazer uma viagem com um ídolo?

Mas admito que só consigo pensar dessa forma zen porque ele não era um ídolo meu, ou por outra, não era próximo. Não tenho um disco dele, não fui a show, não chorei minhas mágoas nem pitangas ao som de seus acordes. Não tinha relação como a que estabeleci, por exemplo, com a Amy ou com o Tim, pelos quais sofri  e chorei a perda como se conhecidos fossem. Envelhecer é ir se acostumando com a morte. A morte de alguém  que viveu tanto e bem, se não lhe é especial, você aceita, concede (ainda que seja um gênio). Para os meus eu não tenho budismo possível – não nesta encarnação.

Helê

Sobre perdas

Recebi a notícia da morte de Dorival Caymmi  com serenidade. Não é que não tenha sentido a morte dele. Mas eu não lamentei. E por uma razão, ou melhor, uma lição duríssima que a vida ensinou, que é a experiência de perder pessoas prematuramente. (Eu ia dizer  ‘pessoas jovens’, mas esse é um adjetivo mais volátil do que parece, e varia muito de acordo com a nossa própria idade.) Falo de todos aqueles que morrem deixando em nós o pesar pelo muito que ficou de ser dito, vivido, compartilhado. Meu tio favorito morto aos 40 anos, um concunhado aos 37, no mesmo ano. Recentemente, o Alexandre da Fal e o Ivan da Beth. Mesmo a partida de desconhecidos ilustres porém queridos, como Cássia Eller e Tim Maia, pesaram no peito. Eu, se pudesse escolher não teria vivido nada disso, mas diante do inevitável não há alternativa a não ser aprender com ele.  Tanto sofrimento deve tem que me servir pra alguma coisa, pô. Como por exemplo,  não lamentar a partida de alguém que, como bem disse o Caetano,  completou sua vida luminosa. Claro que para familiares e amigos  íntimos a morte sempre é “viajar fora do combinado”, como diz o Rolando Boldrin. Mas a gente olha pra uma foto do Caymmi e pensa em numa trajetória que foi cumprida até o fim, numa vida que desenhou um círculo formoso e completo. O que é muito reconfortante, em especial se comparado ao desespero de uma interupção abrupta e injusta.

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Pra terminar o post de maneira positiva, eu evoco a lembrança de um show que vi da Família Caymmi, séclos atrás, no extinto Imperator aqui do Rio (alguém aí lembra?). Páreo duro se sobressair em meio a tantos talentos e vozes, mas quando Dorival entrou no palco – já do alto dos seus quase 80 anos – não teve pra ninguém. Ele fazia caras e bocas, revirava os olhinhos, parecia que estava cantado para cada um, e não pra todos. Encantou a platéia e botou todos no bolso, o danado. Um verdadeiro sedutor .

Helê