(Pre)Conceitos

A sócia estava além-mar e eu fora do ar, então só nesta semana ela me mostrou o texto que o Marcos VP escreveu sobre o lançamento do livro da Fal. Ele aproveitou a oportunidade para dar uma espetada nas motherns, o implicante: elogia a Monix por ser a exceção que confirma a regra que diz que mothern não gosta de criança (!).

Eu não sei de onde você tirou essa idéia, VP, mas a experiência com La Otra deveria abrir seus olhos e seu coração.  Já pensou se ela não é nem regra nem exceção e você está fazendo apenas um juízo apressado? Mais ou menos como as pessoas podem fazer lendo seus textos e surpreendendo-se ao lhe conhecer, como você afirma, no mesmo post.

Você parece ser um bom pai, VP, mas nunca foi mulher – não que eu saiba -,  e por isso não tem como dimensionar o tamanho e peso do Mito da Maternidade. Segundo ele, os filhos justificam os meios: ser mãe é a realização suprema e única para uma mulher. E disso nós, motherns, discordamos. Daí a deduzir que não gostamos de criança…

E mais: pode haver entre nós quem não goste de criança – e entre vós também :-) . Filho e criança não são sinônimos, e uma coisa não tem necessariamente a ver com a outra, como já disse o destemido e perspicaz Alex Castro. Como diz a propaganda, VP, está na hora de rever seus conceitos.

Ou não.

Helê

Update da Monix: o post que deu origem à resposta pode ser lido aqui.

A falha do Zuenir

Acho que fez bem em ir à televisão, embora devesse ter raspado a cabeça. Aquele cabelo bombril parecendo tingido me fez entender o que ele disse uma vez, causando polêmica – que tinha “cabelo ruim”. Zuenir Ventura, “A falha do Ronaldo”, O Globo, 07/05/08, pag. 7

Ok, eu nunca considerei o Zuenir nenhum ativista pela igualdade racial, nem acho que ele tenha que sê-lo mas, pelamordedeus! Esperava que ele tivesse inteligência suficiente para não fazer um comentário absolutamente preconceituoso como esse. Sim, porque eu não espero que as pessoas não sejam preconceituosas, mas exijo que elas não exponham ou propaguem seus preconceitos, especialmente num jornal. Que decepção!

Descobri essa pérola do jornalista no blogue Palavra Sinistra e fui conferir o artigo* pra ver se não havia nenhum mal-entendido – e infelizmente não há. A frase é exatamente essa, dita assim, como se fosse a coisa mais natural do mundo e pertinente à discussão. O Rolo disse tudo lá no Palavra, eu só tenho a acrescentar que esse caso do Ronaldo foi uma oportunidade exemplar para observar um leque de preconceitos: sexuais, sociais e, last but not least, raciais também.

Uma canção pro Zuenir: Respeitem meu cabelos, brancos, do Chico César.

Helê

*O Globo mantém o texto disponível gratuitamente por sete dias, no Arquivo Premium.

Humanos

O mundo é fabuloso
o ser humano é que não é legal

‘Manuel’, Ed Motta

Idelber me chamou pro debate sobre as declarações da ministra Matilde Ribeiro, e eu, que não rasgo dinheiro nem recuso convite de amigo, fui lá dar meu pitaco. Como sempre, o Idelber fez um post brilhante e completo, com os devidos links, argumentos, contra-argumentos e tudo o mais – quando eu crescer quero escrever assim. O que falta, ou melhor, o que pode complementar está nos comentários, que blogueiro realmente bom tem audiência à altura.

Essa rasgação de seda sincera é pra mandar vocês pra  pra saber do babado completo. Eu aqui vou apenas colocar um bordado na barra, contando uma aula marcante sobre racismo e preconceito que eu tive, uns anos atrás:

No programa Sem Censura, da TV Educativa, estava o prof. Joel Rufino dos Santos (com quem trabalhei, de quem fui aluna e que eu admiro profundamente). Devia ser 13 de maio, 21 de março ou outras dessas efemérides que a imprensa usa pra lembrar do tema. A moderadora – na época, a Lúcia Leme – passou ao Joel uma pergunta de um telespectador:

– Prof. Joel, o Fulano de Tal pergunta: ”Eu vejo muito negro racista por aí, então eles não podem reclamar. Por que os negros também têm preconceito contra os brancos?”

E Joel respondeu, serena e rapidamente:

– Porque são humanos.

Houve dois segundos de silêncio completo na mesa, e então Joel explicou o óbvio, que o preconceito é uma tendência humana, manifesta em diferentes culturas e de diferentes formas. A face branca e ocidental dele é apenas uma delas. Justificar um preconceito por outro é estupidez; esperar que negros não sejam preconceituosos é exigir que sejam super-humanos – o que significa, no final das contas, tratá-los como não-humanos, anyway.

Helê

PS: Nem acho que a ministra tenha justificado o racismo, como acusam alguns. Mas a inabilidade dela ao responder me fez lembrar dessa resposta do Joel, pra mim, um primor de síntese e inteligência.

7:00 PM

Abril 13, 2005

O site do Globo tem os blogs dos colunistas, né? Tava lá na Dani Name, uma garota carioca sangue bão:
É SOM DE PRETO, DE FAVELADO…
Mas quando toca, ninguém fica parado.
É som de preto, de favelado… E talvez por isso o funk ainda sofra tanto preconceito.
Funk é música de bandido? Também.
Os bandidos moram – e, infelizmente, mandam – nas comunidades onde o batidão é feito. Os bandidos que moram na periferia gostam de funk porque ela é a música dos pretos que moram nos morros e freqüentam os bailes do subúrbio. E os bandidos – estes bandidos – são, em sua maioria, pretos ou mulatos que moram nestas regiões.
Mas a maioria esmagadora dos funkeiros esbanja suingue nas cadeiras, rapidez para compor, olho fashion para se vestir… e não tem nenhuma relação com a criminalidade.
E há muitos outros bandidos – brancos, de terno – que… bem, devem perder bastante tempo falando mal do funk, do ruído do funk, das letras pornográficas do funk… enquanto fazem suas remessas de dólares roubados do país ou lavados no tráfico para um paraíso fiscal. Uma atitude beeeeem mais pornográfica do qualquer letra funkeira, né?
A introdução imensa é para dizer que esbarrei em muitos bailes e entrevistas com Silvio Essinger enquanto ele estava preparando o livro “BATIDÃO – UMA HISTÓRIA DO FUNK” ( Record), que autografa HOJE, sexta-feira, a partir das 20h, no Circo Voador. Eu estava fazendo uma grande reportagem sobre o ritmo com minha querida amiga Adriana Pavlova aqui para o Segundo Caderno. E ele e Suzana Ribeiro, nossa gloriosa guia no mundo do batidão, eram deliciosas companhias. Sem falar no DJ Marlboro, claro, maestro funkeiro que vara a noite sem nenhum combustível: abstêmio, é movido a guaraná.
Existe coisa mais light, meu povo?
No livro, Essinger tenta mostrar que o funk é música de preto, de favelado… e por isso talvez seja a grande invenção musical do ritmo carioca nesta virada de milênio. Você lembra, né? O samba, conta a história, também sofreu muito preconceito no início do século XX pelo mesmo motivo: era música de preto, de favelado, dos “sujinhos da periferia”. Os branquelos de pince-nez e cadeira dura torciam o nariz, é claro, mortos de inveja.
Essinger quer virar o jogo enquanto desce até o chão, suado, no meio de um baile. Entrevistou grandes estrelas do funk hoje – como Tati Quebra-Barraco,Marlboro, Cidinho & Doca – e também recuperou os bailes de black music do Clube Renascença, na década de 1970; as quadras do Emoções, do Salgueiro e do Chapéu Mangueira; e a cadência da bateria da escola de samba Viradouro, que instituiu a batida funk no carnaval de 1997.
A história do funk é bonita, eu garanto.
Vai correr para comprar o livro ou perder este bonde?

Monix, assinando embaixo